Desabafo por um tempo perdido - Fernando Drummond - São José dos Campos - SP
Reencontrando
o prazer da pilotagem - Nenad Djordjevic,
campeão brasileiro de motovelocidade e piloto de testes.
Atitude mental - Nenad Djordjevic, campeão brasileiro de motovelocidade e piloto de testes.
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Acho esse texto humilde, franco, sereno, escrito de
coração e mente aberta e todas as vezes que o leio, me
emociono..............................Por isso, eu o reproduzo aqui. O autor
está no final.
Desabafo por um tempo perdido
(escrito por viagemdemoto.com publicado em artigos).
Estranho personagem, esse tal de motociclista. Difícil crer
que seja possível preferir o desconforto de uma motocicleta, onde se fica
instavelmente instalado sobre um banquinho minúsculo, tendo que fazer
peripécias para manter o equilíbrio e torcendo para que não haja areia na
estrada.
Como podem achar bom transportar o passageiro, dito garupa,
sem nenhum conforto ou segurança, forçando o coitado a agarrar-se à pança do
motociclista, sujeitando ambos a toda sorte de desconfortos, como chuva, ou
mesmo aquela “ducha” de água suja jogada pelo carro que passa sobre a poça ao
lado, ou de ficarem inalando aquele malcheiroso escapamento dos caminhões em
uma avenida movimentada como a marginal Tietê, por exemplo, sem falar da
necessidade de se utilizar capas, casacos e capacetes, mesmo naqueles dias de
calor intenso.
Isso tudo enquanto convivemos numa época em que os
automóveis nos oferecem toda sorte de confortos e itens de segurança.
Ar-condicionado, que permite que você chegue ao trabalho sem estar fedendo e
suado; “air bags”, barras laterais, cintos de três pontos, etc., que conferem
ao passageiro uma segurança mais do que necessária; som ambiente; possibilidade
de conversar com os passageiros (os passageiros...) sem ter que gritar e assim
por diante.
Intrigante personagem, esse tal de motociclista.
Apesar de tudo o que disse acima, vejo sempre em seus rostos
um estranho e particular sorriso, que não me lembro de haver esboçado quando em
meu carro, mesmo gozando de todas as facilidades de que ele dispõe.
Passei, então, a prestar um pouco mais de atenção e percebi
que, durante minhas viagens, motociclistas, independente de que máquinas
possuíssem, cumprimentavam-se uns aos outros, apesar de aparentemente jamais
terem se visto antes daquele fugaz momento, quando se cruzaram em uma dessas
estradas da vida.
Esquisito...
Prestei mais atenção e descobri que eles freqüentemente se
uniam e reuniam, como se fossem amigos de longa data, daqueles que temos tão
poucos e de quem gostamos tanto.
Senti a solidariedade que os une. Vi também que, por baixo
de muitas daquelas roupas de couro pesadas, faixas na cabeça, luvas, botas,
correntes e caveiras, havia pessoas de todos os tipos, incluindo médicos,
juízes, advogados, militares, etc. que, naquele momento, em nada faziam lembrar
os sisudos, formais e irrepreensíveis profissionais que eram no seu dia a dia.
Descobri até alguns colegas, a quem jamais imaginei ver paramentados tão
estranhamente.
Muito esquisito...
Ao conversar com alguns deles, ouvi dos indizíveis prazeres
de se “ganhar a estrada” sobre duas rodas; sobre a sensação deliciosa de se
fazer novos amigos por onde se passa; da alegria da redescoberta do prazer da
aventura, independente da idade; e da possibilidade de se ser livre e alegre,
rompendo barreiras que existem apenas e tão somente em nossas mentes tão
acostumadas à mediocridade.
Vi, ouvi e meditei sobre o assunto... mudei minha vida...
Maravilhoso personagem, esse tal de motociclista.
Muitas motos eu tive, mas jamais fui um verdadeiro
motociclista, erro que, em tempo, trato agora de desfazer.
Mais que uma nova moto, a moto dos meus sonhos.
Mais que apenas uma moto, o rompimento dos grilhões que a
mim impunham o medo e o preconceito e que por tanto tempo me impediram de
desfrutar de tantas aventuras e amizades.
Deus sabe o tempo que perdi e as experiências que deixei de
vivenciar.
Se antes olhava-os com estranheza, mesmo sendo proprietário
de uma moto (mas não um motociclista), vejo-os agora com profunda admiração e,
quando não estou junto, com uma deliciosa pontinha de inveja.
O interessante, é que conheço pessoas que jamais possuíram
moto, mas que estão em perfeita sintonia com o ideal motociclista. Algumas
chegam até mesmo a participar de encontros e listas de discussão, não que isto
seja imprescindível ou importante. O que importa é a filosofia envolvida.
Hoje, minha esposa e eu, montados em nossos sonhos,
planejamos, ainda timidamente, lances cada vez maiores, sempre dispostos a
encontrar novos velhos amigos, que certamente nos acolherão de braços abertos.
Talvez, com um pouco de sorte, encontremos algum motorista
que, em seu automóvel, note e ache estranho aquele personagem que, passando em
uma motocicleta, com o vento no rosto, ainda que sob chuva ou frio, mostre-se
alheio a tudo e feliz, exibindo um largo e incompreensível sorriso estampado no
rosto.
Quem sabe ganhemos, então, mais um irmão motociclista para o
nosso grupo.
Fernando Drummond
São José dos Campos-SP
Reencontrando
o prazer da pilotagem.
Além da velocidade, há outras formas de se
deliciar com uma moto.
A escolha do tema desta edição foi motivada
por um evento infeliz ocorrido no último mês – mais um amigo “subiu para o
andar de cima” de maneira prematura e infeliz. Mais um que abusou da sorte em
lugar e hora inapropriados – mais um, entre tantos, que achou que certas coisas
“ só acontecem com os outros” – mais um que permitiu que a adrenalina dominasse
o bom senso, tendo que pagar o preço...
Quem gosta da velocidade, adora a sensação da
descarga de adrenalina que ela provoca. É viciante ! É o tipo de coisa que, uma
vez descoberta, é difícil abandonar. Parece que toma integralmente seu corpo e
sua mente e a única coisa existente é um sentimento de “quero mais e mais”. Não
notar essa transformação física e psicológica é um terrível erro, desses que se
pagam com a vida. A sensação é a de se estar drogado com qualquer substância
viciante, sendo a única coisa importante acelerar mais.
Ao longo dos anos, convivendo com as perdas
ao meu redor – sim, de pessoas conhecidas, não mais anônimos de quem se ouve
falar – fui cada vez mais tomado por essa latente necessidade de gritar a
plenos pulmões: “mas por quê ?” Aos poucos, vou descobrindo que é da nossa
natureza esse comportamento infeliz – e é perfeitamente compreensível: afinal,
é bom demais! É gostoso poder exercer o controle sobre uma máquina capaz de nos
levar a velocidades extremas, muito maiores àquelas para as quais nosso corpo e
mente estão preparados, do ponto de vista evolutivo.
Mas, mesmo sendo “ultra-mega-hiper-gostoso”,
outros aspectos tem que ser levados em conta – afinal, não nutro um
irresistível desejo de morrer. Além do prazer oferecido pela velocidade e
controle do equipamento, tenho outros aspectos da vida que também são fonte de
prazer e satisfação. E são eles que, de certa forma, contém meus abusos e
excessos. Quanto mais me conheço e presto atenção à maneira que me comporto,
mais noto que apenas as outras formas de satisfação não são suficientes para
conter esse ímpeto de acelerar. É preciso mais.
Descobri que o ato de focar na qualidade da pilotagem
que estou executando no momento modificou ligeiramente essa tendência de só
virar o da direita. Prestando atenção em como me coloco sobre a moto, onde
encaixo os pés, que ângulo minhas mãos
fazem com as manoplas, para onde estou olhando, que pressão exerço no guidão e
tantos outros aspectos da pilotagem, me permito obter mesmo uma mudança
comportamental, uma vez que a atenção a todos esses aspectos demanda tempo,
impondo uma diminuição natural da velocidade. Notei que fazer as coisas com
perfeição no comando de uma moto também pode ser uma fonte de prazer – talvez
não tão enfática quanto a velocidade, mas, com certeza, mais saudável.
Hoje, quando sento em uma moto, seja
profissionalmente ou em momento de lazer, me preocupo em dar bastante espaço a
esse sentimento de busca pela perfeição na pilotagem, mesmo sendo ela utópica.
Ao procurar fazer todos os movimentos de maneira suave, precisa, com exata
amplitude, exerço a atenção e, principalmente, docilidade na operação de todos
os comandos, Busco obter o máximo em suavidade no movimento, entendendo que ela
é representante oficial de um centro de gravidade estável, derivando em um
objeto dócil e previsível sendo comandado.
Dou muita ênfase à qualidade da visão que
coleto a cada instante – olhar bastante à frente permite que se tenha condições
de julgar com melhor qualidade as situações com as quais terei de interagir,
pois ganhei tempo para isso. Busco, a
todo instante, maior “feeling” do comportamento dos pneus, dos freios, da
ciclística. Levo a moto para inclinações desejadas com compenetração,
seriedade, propósito. Tento sentir as particularidades do modelo, suas reações,
suas respostas aos meus comandos. Descobri, nessa mudança de foco, uma
inesgotável fonte de satisfação, pois recebo em troca um movimento suave,
totalmente na medida do que preciso e sem ter que “tirar suquinho” do
equipamento.
Mas o poder da velocidade e a pressão que
exerce sobre a psique é grande. Por vezes, mesmo cercando-se de todos os
cuidados e focando na plena intenção de voltar inteirinho para casa, abusos
acontecem. Outra medida eficaz que encontrei quando todo o resto falha é me
lembrar das pessoas amigas que partiram e em que condições se foram. Ao
recordar de seus rostos, sorrisos e expressões – até em seu leito de morte -,
sou tomado por uma irresistível vontade de desacelerar. É um verdadeiro
desestimulante. O exato “Viagra” ao contrário.
Espero que você, caro leitor, que tenha se
identificado com esse sentimento, procure também o controle das próprias ações,
assim como procura o controle da máquina. Não permite que aqueles que o amam
tenham que sofrer uma perda por conta de algo que você poderia ter controlado –
afinal de contas, quem manda em sua vida?
Revista Moto Adventure n. 120 – Artigo de
Nenad Djordjevic, campeão brasileiro de motovelocidade, piloto de testes e
instrutor do curso de pilotagem Performance Professional Riding, para
motociclistas. Perguntas ou sugestões para essa seção devem ser endereçadas
para: revista@motoadventure.com.br Assunto:
Performance. Veja mais informações no blog do autor:
HTTP://cursodepilotagem.blogspot.com.
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Atitude Mental.
Ter uma atitude mental correta ajuda o motociclista a se inserir no meio
em que opera com maior segurança
Alguns podem questionar o que a atitude mental tem a ver com pilotagem,
mas basta observar atentamente como a pilotagem se processa para concluir sua
relevância – antes de tudo, coletamos as informações a respeito do meio em que
operamos através da visão e audição, interpretamos essas informações, e no
final, trazemos alguma forma de solução para a interação. Conclui-se então, que
a pilotagem em si é essencialmente um processo intelectual, onde a parte
prática, a execução de manobras, nada mais é que a conclusão de um pensamento
previamente elaborado.
Um motociclista está na maior parte do tempo operando em um meio hostil
– os veículos ao seu redor são maiores e oferecem maior proteção aos seus
usuários. Mais do que isso, a moto permite maior desenvoltura frente a maioria
dos veículos com que interage, colocando-a constantemente em condições de
ultrapassagem – além de maior risco. Essas características determinam que o
usuário de uma motocicleta tem de estar totalmente focado em como procede com
essa interação, porque lhe cabe oferecer segurança para si e para os demais,
uma vez que está na maior parte do tempo interagindo de forma ativa com o
trânsito, e não de forma passiva. Agora fica mais nítida a idéia de que um
motociclista precisa ter uma atitude mental pro-ativa – uma vez que suas
decisões afetarão a sua segurança, bem como a dos demais.
Serenidade
Todas as decisões tomadas por um piloto de moto devem ser tomadas de
forma ponderada – com boa análise de todas as possibilidades relativas a uma
situação. Para que isso seja exequível, ele ou ela não pode ter sua mente
invadida por pensamentos alheios ao processo da pilotagem. Uma discussão
familiar, um problema financeiro ou um mal estar físico, são exemplos de coisas
externas que podem facilmente tomar a mente de qualquer pessoa. Um piloto
consciente, tem de reconhecer essa possibilidade e criar os mecanismos
necessários para impedir que aconteça. O pensamento que deve prevalecer no
momento de iniciar a pilotagem é semelhante a esse:
"Nada é mais importante nesse momento que eu chegar a meu destino
em segurança. Absolutamente nada. Todo o resto é secundário, e será tratado
quando for a hora."
Uma frase como essa deve ecoar na mente do motociclista sempre que notar
uma dispersão – pensamento que nada tem com o que está sendo executado naquele
instante. Tente repetí-la mentalmente algumas vezes, para que seja fácil
memorizar, e de fato usar, sempre que achar que sua atenção está indo para
situações que não fazem parte da pilotagem daquele momento.
Iniciantes
Os pilotos iniciantes estão com suas mentes cheias de dúvidas e
incertezas. As metas que estabelecem para si quanto a distância a ser
percorrida ou o tempo que pilotarão, devem levar em conta suas aptidões e
conhecimento do que estão se propondo a fazer. O ideal é que na fase inicial, o
candidato a piloto estabeleça metas que se sinta razoavelmente confortável para
executar. Digo razoavelmente, porque deve haver uma pequena incerteza para
poder promover alguma evolução – no entanto, não pode ser tão crítica a ponto
de comprometer a segurança. Se existem dúvidas quanto a algum procedimento com
impacto na segurança, essas devem ser tratadas antes de se tentar a execução
durante a pilotagem.
Pensamentos que incluam durante a pilotagem as palavras
"acho", "talvez", ou semelhantes, devem ser afastados a
todo custo – um motociclista tem poucas chances de errar. Deve ter bastante
certeza do que está por vir, e as dificuldades que encontrará, racionalizando
todos os possíveis problemas antes mesmo de acontecerem. Para esses futuros
pilotos, o pensamento apropriado deve ser semelhante a esse:
"Vou dar o melhor de mim reconhecendo cuidadosamente minhas
limitações. Ainda estou aprendendo, e quero continuar assim – sempre aprendendo
mais."
Experientes
Pilotos experientes estão mais sujeitos a toda forma de incidentes, pois
frequentemente, subjulgam as situações e os procedimentos apropriados,
superestimando as próprias capacidades, sem base lógica consistente. Daí se
verem envolvidos em situações difíceis, com frequência muito maior que um
iniciante.
O aparente domínio do equipamento, acaba impulsionando esse piloto a
considerar também estar no controle das situações à seu redor – mas a realidade
é que há um limite no que pode ser controlado pelo piloto, e é absolutamente
vital que haja o reconhecimento de que nem tudo está sob seu domínio, exigindo
a previsão de uma margem de segurança.
Esses pilotos acabam se deixando influenciar por palavras que traduzem
alguma forma de obrigatoriedade, como "preciso", "tenho
que", permitindo que necessidades externas dominiem sua razão e o objetivo
principal – voltar inteiro para casa. Além do pensamento inicial relativo a
serenidade, esses pilotos devem mentalizar algo que lhes permita recolocar o
foco nos procedimentos em execução:
"Os melhores pilotos do mundo erram – vou criar mais tempo para
rever cada atitude que tomo, para minimizar essa possibilidade."
Ego
O ego de um motociclista é normalmente um pouco mais inflado do que o da
maioria não pertencente a essa categoria. Todos nós acabamos em alguma
instância vencidos pelo desejo de externar nosso conhecimento, habilidade ou
maestria da moto. As exibições de ousadia frequentemente tem platéia,
impulsionando ainda mais o imaturo, contra a prudência. Para tentar derrotar
esses pensamentos estranhos, o piloto consciente deve tentar colocar o foco de
seu pensamento em outra forma de recompensa:
"Vou pilotar somente para o meu prazer. O que os outros acham de
minha pilotagem não é importante."
Outros pensamentos
Dominar nossos sentidos, percepções e habilidades é tarefa das mais
complicadas – exige auto-conhecimento e postura madura que não estão presentes
em todas as fazes de nossas vidas. Para os mais impetuosos é tarefa árdua e
sistemática – tem de se auto-impor muita disciplina constantemente. Se você é
assim, aí vão alguns pensamentos que me ajudaram a controlar minhas próprias
ações:
"O prazer da pilotagem está na precisão, e não na ousadia."
"Quanto mais suave sou com o equipamento, mais suave é a sua
resposta."
"Competir tem hora e local apropriado – cabe agora?"
Esse é um pequeno vislumbre da complexidade presente na pilotagem
motociclística – considere suas implicações e domine seus pensamentos. Não
permita que agentes externos e alheios ao ato de pilotar interfiram nesse
processo. Apesar de pilotar uma moto trazer emoções difíceis de descrever,
temos que mantê-las sob controle em prol da segurança.
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Porquê viajar ?
Quando eu era adolescente, vi uma fotografia de Mário de
Andrade sobre os trilhos da estrada de ferro Madeira-Mamoré - também conhecida
como a “Ferrovia do Diabo”. Sua presença foi registrada durante a construção da
obra, em plena selva amazônica, no início do século XX. Um empreendimento
histórico que ceifou a vida de 6 mil trabalhadores, vitimados por ataques de
índios, afogamentos, picadas de cobra e doenças diversas, como malária, febre
amarela, beribéri e tuberculose.
Achei curioso aquele fato. Por que um escritor da Paulicéia estaria tão longe de casa, em local tão ermo? Quantos dias ou semanas teria ele gastado para chegar ali? Por qual razão?
Naquela época, eu mal sabia que Mário de Andrade não era uma pessoa comum. Seus livros e estórias nasciam do contato profundo com o Brasil Escondido. Ele havia decidido mergulhar nas entranhas de seu país e de seu povo. Sua arte dependia disso! Estar ali, no meio do nada, era uma ginástica aparentemente corriqueira para ele. Depois soube que foi por aquelas paragens amazônicas que encontrou inspiração e conteúdo para sua maior obra: Macunaíma.
À medida que fui crescendo, ganhando maturidade e me apaixonando cada vez mais por literatura, passei a perceber que os chamados escritores de primeira grandeza possuíam, via de regra, essa característica. Escreviam sobre locais, pessoas e sentimentos que conheciam de perto. Não apenas dominavam as letras, mas sabiam se colocar como atores e aprendizes de uma realidade social que poucos imaginavam existir. Essa característica não pertencia apenas a Mário de Andrade, mas a muitos outros escritores que marcaram nossos tempos: Gabriel Garcia Márquez, Neruda, Sábatto, Borges, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, dentre outros. Talvez fosse o exercício de se embrenhar pelas terras esquecidas e pela história de seus países o grande diferencial que os transformou em homens inesquecíveis para a humanidade. Sabiam bem do que falavam. As emoções e os cenários de suas estórias estavam gravados (também) em suas próprias peles.
Os grandes homens e poetas são, em sua imensa maioria, eternos viajantes. Não viajantes comuns, mas exploradores. Uma verdadeira viagem tem que ter essa conotação: explorar, superar limites, desejar o novo. Buda, Cristo, Francisco de Assis, Gandhi e Paulo de Tarso eram viajantes solitários, exploradores de almas, e gastaram muita sola de calçado na caminhada da iluminação.
VIAJAR, sob todos esses aspectos, tornou-se essencial para mim, para minha própria formação intelectual e espiritual. Foi o meio que utilizei para amadurecer e fortalecer meu espírito e para experimentar um tipo de felicidade que ainda não conhecia. De falar com propriedade das coisas que vi, que senti e que presenciei. Creio que o verdadeiro encontro interior para alguns, como eu, precisa passar pela experiência do ir para longe e do voltar feliz para casa. Do desvendar o que existe além da montanha e do rio. Do experimentar diferentes sons, odores e temperaturas. Do contemplar o sol, a chuva ou as estrelas. Do conhecer pessoas simples e do aprender com elas.
Eu, após viajar muito de ônibus, de avião e automóvel, só consegui experimentar um contato profundo comigo mesmo depois que passei a viajar de motocicleta. Sabe-se lá o porquê, mas sempre tentei me justificar acreditando que pilotar uma moto por longos períodos de tempo gera um estado mental diferenciado. O corpo, em contato direto com o ambiente, parece estar sob as carícias da natureza. A mente relaxa, mas os reflexos ficam acesos e prontos para dar comandos rápidos aos membros. Em outra oportunidade cheguei a comparar esse estado psíquico ao que os antigos monges taoístas chamavam de “encontrar o silêncio no meio da tempestade”. É uma espécie de inebriamento que só acontece quando nos deslocamos em velocidade moderada. Quando se acelera com exagero as emoções são diferentes, decorrem da adrenalina, mas não se atinge essa condição espiritual.
Contudo, não advogo a tese de que a motocicleta é o melhor veículo para todos. Trata-se de uma constatação pessoal. Sei de outros viajantes que vivenciaram emoções idênticas dentro de um jipe, de um veleiro, sobre uma bicicleta ou simplesmente caminhando ou mochilando pelas estradas do mundo.
Quem viaja está sempre construindo algo diferente para suas vidas. Está abrindo seu coração para novos sentimentos e amizades. Está descerrando a mente para novos conhecimentos, os olhos para novos cenários e horizontes. Enfim, compartilhando sua alma com o planeta que o acolhe.
Achei curioso aquele fato. Por que um escritor da Paulicéia estaria tão longe de casa, em local tão ermo? Quantos dias ou semanas teria ele gastado para chegar ali? Por qual razão?
Naquela época, eu mal sabia que Mário de Andrade não era uma pessoa comum. Seus livros e estórias nasciam do contato profundo com o Brasil Escondido. Ele havia decidido mergulhar nas entranhas de seu país e de seu povo. Sua arte dependia disso! Estar ali, no meio do nada, era uma ginástica aparentemente corriqueira para ele. Depois soube que foi por aquelas paragens amazônicas que encontrou inspiração e conteúdo para sua maior obra: Macunaíma.
À medida que fui crescendo, ganhando maturidade e me apaixonando cada vez mais por literatura, passei a perceber que os chamados escritores de primeira grandeza possuíam, via de regra, essa característica. Escreviam sobre locais, pessoas e sentimentos que conheciam de perto. Não apenas dominavam as letras, mas sabiam se colocar como atores e aprendizes de uma realidade social que poucos imaginavam existir. Essa característica não pertencia apenas a Mário de Andrade, mas a muitos outros escritores que marcaram nossos tempos: Gabriel Garcia Márquez, Neruda, Sábatto, Borges, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, dentre outros. Talvez fosse o exercício de se embrenhar pelas terras esquecidas e pela história de seus países o grande diferencial que os transformou em homens inesquecíveis para a humanidade. Sabiam bem do que falavam. As emoções e os cenários de suas estórias estavam gravados (também) em suas próprias peles.
Os grandes homens e poetas são, em sua imensa maioria, eternos viajantes. Não viajantes comuns, mas exploradores. Uma verdadeira viagem tem que ter essa conotação: explorar, superar limites, desejar o novo. Buda, Cristo, Francisco de Assis, Gandhi e Paulo de Tarso eram viajantes solitários, exploradores de almas, e gastaram muita sola de calçado na caminhada da iluminação.
VIAJAR, sob todos esses aspectos, tornou-se essencial para mim, para minha própria formação intelectual e espiritual. Foi o meio que utilizei para amadurecer e fortalecer meu espírito e para experimentar um tipo de felicidade que ainda não conhecia. De falar com propriedade das coisas que vi, que senti e que presenciei. Creio que o verdadeiro encontro interior para alguns, como eu, precisa passar pela experiência do ir para longe e do voltar feliz para casa. Do desvendar o que existe além da montanha e do rio. Do experimentar diferentes sons, odores e temperaturas. Do contemplar o sol, a chuva ou as estrelas. Do conhecer pessoas simples e do aprender com elas.
Eu, após viajar muito de ônibus, de avião e automóvel, só consegui experimentar um contato profundo comigo mesmo depois que passei a viajar de motocicleta. Sabe-se lá o porquê, mas sempre tentei me justificar acreditando que pilotar uma moto por longos períodos de tempo gera um estado mental diferenciado. O corpo, em contato direto com o ambiente, parece estar sob as carícias da natureza. A mente relaxa, mas os reflexos ficam acesos e prontos para dar comandos rápidos aos membros. Em outra oportunidade cheguei a comparar esse estado psíquico ao que os antigos monges taoístas chamavam de “encontrar o silêncio no meio da tempestade”. É uma espécie de inebriamento que só acontece quando nos deslocamos em velocidade moderada. Quando se acelera com exagero as emoções são diferentes, decorrem da adrenalina, mas não se atinge essa condição espiritual.
Contudo, não advogo a tese de que a motocicleta é o melhor veículo para todos. Trata-se de uma constatação pessoal. Sei de outros viajantes que vivenciaram emoções idênticas dentro de um jipe, de um veleiro, sobre uma bicicleta ou simplesmente caminhando ou mochilando pelas estradas do mundo.
Quem viaja está sempre construindo algo diferente para suas vidas. Está abrindo seu coração para novos sentimentos e amizades. Está descerrando a mente para novos conhecimentos, os olhos para novos cenários e horizontes. Enfim, compartilhando sua alma com o planeta que o acolhe.
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